Enquanto na
linguagem popular a palavra demência tem a conotação de loucura, em
medicina é usada com o significado de declínio adquirido, persistente, em
múltiplos domínios das funções cognitivas e não cognitivas. O declínio das
funções cognitivas é caracterizado pela dificuldade progressiva em
reter memórias recentes, adquirir novos conhecimentos, fazer cálculos numéricos
e julgamentos de valor, manter-se alerta, expressar-se na linguagem
adequada, manter a motivação e outras capacidades superiores.
Perder
funções não cognitivas significa apresentar distúrbios de comportamento que vão
da apatia ao isolamento e à agressividade.
Doença de
Alzheimer é a forma mais comum de demência neurodegenerativa em pessoas de
idade. A causa da doença é desconhecida. Assista abaixo um vídeo explicativo sobre a doença:
FATORES DE RISCO
Idade
Embora
existam casos esporádicos em pessoas de 50 anos e a prevalência na faixa
etária de 60 a 65 anos esteja abaixo de 1%, a partir dos 65 anos ela
praticamente duplica a cada cinco anos. Depois dos 85 anos de idade,
atinge 30 a 40% da população.
História familiar
O risco é
mais alto em pessoas que têm história familiar de Alzheimer ou outras
demências. Estudo conduzido na Suécia entre 65 pares de irmãos gêmeos
mostrou que quando um deles apresentava Alzheimer, o irmão gêmeo idêntico
era atingido pela doença em 67% dos casos; o gêmeo diferente, em 22%.
Síndrome de Down
Em portadores
da síndrome de Down a doença surge com frequência mais alta e as
alterações neuropatológicas se instalam mais precocemente.
Apolipoproteína E
Além de
outras funções, o colesterol é necessário para a integridade da bainha de
mielina que envolve as raízes nervosas. A apolipoproteína é uma proteína
presente na circulação, importante no transporte de colesterol no sistema
nervoso central. Indivíduos em que essa proteína possui determinadas
características genéticas têm probabilidade mais alta de desenvolver Alzheimer.
Sexo
Parece haver
pequeno predomínio da doença entre as mulheres. Para quem chegou aos 65
anos, o risco futuro de surgir Alzheimer é de 12% a 19% no sexo feminino;
e de 6% a 10% nos homens.
Trauma craniano
Boxeadores e
pessoas que sofreram traumas cranianos parecem mais sujeitos à
enfermidade, embora nem todos os estudos comprovem essa relação.
FATORES PROTETORES
Escolaridade
A aquisição
de conhecimentos cria novas conexões entre os neurônios (sinapses) e
aumenta a reserva intelectual, fatores que retardam o aparecimento das
manifestações de demência. O analfabetismo e a baixa escolaridade estão
associados à maior prevalência.
Atividade física
Vários
estudos sugerem que a atividade física tenha efeito protetor.
QUADRO ANÁTOMO-PATOLÓGICO
Os doentes
apresentam cérebros atrofiados de forma difusa, mas não uniforme; as áreas
mais atrofiadas são principalmente as que coordenam atividades
intelectuais.
Ao
microscópio notam-se perda de neurônios e degeneração das sinapses. Duas
alterações patológicas dominam o quadro: as placas senis e os emaranhados
neurofibrilares.
Placas senis
são formadas pelo depósito de uma proteína (beta-amilóide), no espaço
existente entre os neurônios. Já, os emanharados neurofibrilares são
formados por uma proteína (tau) que se deposita no interior dos neurônios.
As alterações
cerebrais precedem as manifestações clínicas por 20 a 40 anos.
QUADRO CLÍNICO
A doença se
instala de forma insidiosa, com queixas de dificuldade de memorização e desinteresse pelos acontecimentos diários,
sintomas geralmente menosprezados pelo paciente e familiares.
Inicialmente
é comprometida a memória de trabalho, memória de curta duração que nos
permite exercer a rotina diária. Os pacientes esquecem onde deixaram as
chaves do carro, a carteira, o talão de cheques, o nome de um conhecido.
Com o tempo, a pessoa larga as tarefas pela metade, esquece o que foi
fazer no quarto, deixa o fogão aceso, abre o chuveiro e sai do banheiro,
perde-se no caminho de volta para casa.
Caracteristicamente,
esses “esquecimentos” se agravam quando o paciente é obrigado a executar
mais de uma tarefa ao mesmo tempo. A perda de memória é progressiva e
obedece a um gradiente temporal, segundo o qual a incapacidade para
lembrar fatos recentes, contrasta com a facilidade para recordar o
passado.
As primeiras
habilidades perdidas são as mais complexas: manejo das finanças,
planejamento de viagens, preparo de refeições. A capacidade de executar
atividades mais básicas como vestir-se, cuidar da higiene ou alimentar-se,
é perdida mais tardiamente.
Com o tempo a
dificuldade de aprendizado se acentua. Quando colocamos o paciente diante de uma lista de palavras e pedimos que
as evoque ao terminar de memorizá-las, o desempenho é medíocre.
A linguagem,
comprometida discretamente no início do quadro, torna-se vazia, desprovida de
significado, embora a fluência possa ser mantida. A orientação
espaço-visual se deteriora, criando dificuldade de orientação e de
reconhecimento de lugares anteriormente bem conhecidos.
O quadro
degenerativo se estende às funções motoras. Andar, subir escadas, vestir-se,
executar um gesto sob comando, tornam-se atividades de execução cada vez
mais problemática.
A percepção
das próprias deficiências, preservada no início, fica gradualmente
comprometida. Na fase avançada, mutismo, desorientação espacial,
incapacidade de reconhecer faces, de controlar esfíncteres, de realizar as
tarefas de rotina, pela alteração do ciclo sono/vigília e pela dependência
total de terceiros são sintomas característicos da doença.
ESTÁGIOS
De acordo com
a intensidade do quadro degenerativo há três estágios clínicos: leve, moderado
ou grave.
Existe grande
variabilidade na duração desses estágios. Em alguns casos os sintomas evoluem
lentamente possibilitando a manutenção de níveis funcionais razoáveis por
muitos anos; em outros, a deterioração é mais rápida, mas ocorre em velocidade
constante; em outros, ainda, a doença evolui em surtos de piora seguidos de
fases de estabilidade que chegam a durar um ano ou mais.
Os estudos
mostram que a duração de cada estágio também é extremamente variável. Em média,
o primeiro estágio tem duração de 2 a 10 anos; o segundo, de 1 a 3 anos; e o
terceiro, de 8 a 12 anos.
Esses
estágios podem ser subdivididos em sete outros, com as seguintes
características:
1 –
Pré-clínico: silencioso; sem perda cognitiva observável;
2 –
Transtorno cognitivo leve: primeiras evidências de perda cognitiva;
3 – Forma leve:
esquecimentos; familiares e amigos notam o problema;
4 – Forma
moderada: confusão mental; agitação; ansiedade; apatia;
5 – Forma
moderadamente grave: não consegue lidar com afazeres pessoais; desorientação no
tempo e espaço; dependência;
6 – Forma
grave: necessita de cuidados em tempo integral; incontinência urinária e fecal;
delírios; obsessões; freqüentemente requer internação;
7 – Forma
muito grave: perda da fala; incapacidade de locomoção; perda da consciência.
TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
O processo degenerativo
na doença de Alzheimer leva à deficiência de diversos neurotransmissores,
moléculas que atuam na condução dos estímulos nervosos transmitidos de um
neurônio para outro.
Hoje,
procuramos corrigir esse déficit com dois grupos de drogas: os inibidores das
colinesterases e os antagonistas dos receptores de glutamato.
A
acetilcolina é um neurotransmissor importante nos mecanismos de memória e
aprendizagem. Na doença de Alzheimer, como conseqüência da degeneração dos
neurônios, ocorre redução da atividade da acetilcolina por ação de enzimas que
a degradam. Essa perda de atividade está associada ao declínio cognitivo.
Embora várias
drogas estejam sendo testadas, atualmente, o tratamento mais eficaz se baseia
na utilização das que inibem a ação enzimática responsável pela degradação da
acetilcolina (inibidores da acetilcolinesterase).
Esses
medicamentos têm eficácia documentada, e estão indicados no tratamento das
formas leve ou moderada, com a finalidade de ajudar os pacientes a manter a
habilidade de executar as atividades de rotina por mais tempo e de preservar a
capacidade de relacionar-se com os familiares e amigos.
RESPOSTA AO TRATAMENTO
A doença é
incurável. O objetivo da terapêutica é retardar a evolução e preservar por mais
tempo possível as funções intelectuais. Os melhores resultados são obtidos
quando o tratamento é iniciado nas fases mais precoces.
Numa doença
que progride inexoravelmente, nem sempre é fácil avaliar resultados. Por essa
razão, é fundamental que os familiares utilizem um diário para anotar a
evolução dos sintomas.
A memória
está melhor? Os afazeres diários são cumpridos com mais facilidade? O quadro
está estável? O declínio ocorre de forma mais lenta do que antes da medicação?
Sem essas anotações fica impossível avaliar a eficácia do tratamento.
PRINCÍPIOS GERAIS
Efeitos colaterais
As drogas
pertencentes ao grupo dos anticolinesterásicos podem provocar sintomas
gastrointestinais, circulatórios e alterações relacionadas com o sistema
nervoso central. Na maioria das vezes, esses efeitos indesejáveis são
passageiros, de curta duração e podem ser controlados ou desaparecer quando o
médico reajusta as doses. Em caso de toxicidade, entre em contato com seu
médico. Não suspenda o tratamento por conta própria.
Duração do tratamento
Uma vez
iniciado, o tratamento precisa ser reavaliado pelo médico ao completar um mês,
mas deve ser mantido obrigatoriamente por um período mínimo de 3 a 6 meses,
para que se possa ter idéia da eficácia. Enquanto a resposta for favorável, o
medicamento não deve ser suspenso.
Adesão
É fundamental
a tomada diária nas doses e observar os intervalos prescritos. A administração
irregular compromete o resultado final.
A população
de mulheres e homens com mais de 65 anos é a que mais cresce no Brasil e em
outros países. Com o aumento da longevidade, é cada vez mais comum o
aparecimento de quadros neuropsiquiátricos caracterizados pelas seguintes
manifestações:
* Falta de
memória para acontecimentos recentes;
* Repetição
da mesma pergunta várias vezes;
* Dificuldade
para acompanhar conversações ou pensamentos complexos;
*
Incapacidade de elaborar estratégias para resolver problemas;
* Dificuldade
para dirigir automóvel e encontrar caminhos conhecidos;
* Dificuldade
para encontrar palavras que exprimam idéias ou sentimentos pessoais;
*
Irritabilidade, suspeição injustificada, agressividade, passividade,
interpretações erradas de estímulos visuais ou auditivos, tendência ao
isolamento.
Pessoas que
apresentem manifestações como essas devem ser acompanhadas de perto, porque uma
parcela significativa delas evolui para quadros de demência. Calcula-se que de
10% a 15% das que atingem 65 anos já apresentem sinais da enfermidade. Daí em
diante, a prevalência cresce 3% ao ano, até atingir quase 50% das que chegam
aos 85 anos.
Entre os
quadros de demência, o mais comum é a doença de Alzheimer, descrita em 1907
pelo neurologista alemão Alois Alzheimer. Estima-se que, no mundo, haverá 22
milhões portadores desse mal em 2025.
A doença de
Alzheimer instala-se quando o processamento de certas proteínas do sistema
nervoso central começa a dar errado. Surgem, então, fragmentos de proteínas mal
cortadas, tóxicas, dentro dos neurônios e nos espaços que existem entre eles.
Como consequência dessa toxicidade, ocorre perda progressiva de neurônios em
certas regiões do cérebro, como o hipocampo, que controla a memória, e o córtex
cerebral, essencial para a linguagem e o arrazoamento, memória, reconhecimento
de estímulos sensoriais e pensamento abstrato.
Estudos
publicados na década de 1980 mostraram que a proteína que se acumula dentro dos
neurônios (tau) dos doentes com Alzheimer, é diferente da que se acumula nos
espaços existentes entre eles (beta-amilóide). A proteína beta-amilóide se
deposita em placas que causam destruição de neurônios por criar processo
inflamatório crônico nas regiões afetadas, interferir com a regulação de
cálcio, essencial para a condução dos estímulos nervosos, e aumentar a produção
de radicais livres, tóxicos para as células nervosas.
Certas
famílias apresentam prevalência mais alta da doença de Alzheimer, mas podem
surgir casos esporádicos da doença em famílias que nunca os apresentaram. Cerca
de 10% a 60% dos pacientes com histórico familiar da doença apresentam
instalação precoce e evolução rápida dos sintomas. Neles, foram descritas
mutações de genes presentes nos cromossomos 1 e 14. Nas formas de Alzheimer que
se instalam mais tardiamente, parece estarem envolvidos outros genes, ligados à
apolipoproteína E, envolvida no transporte de colesterol e na reparação de
defeitos celulares.
A doença de
Alzheimer costuma evoluir de forma lenta e inexorável. A partir do diagnóstico,
a sobrevida média oscila entre 8 e 10 anos. O quadro clínico costuma ser
dividido em quatro estágios:
Estágio 1
(forma inicial): Alterações na memória, personalidade e nas habilidades visuais
e espaciais;
Estágio 2
(forma moderada): Dificuldade para falar, realizar tarefas simples e coordenar
movimentos. Agitação e insônia;
Estágio 3
(forma grave): Resistência à execução de tarefas diárias. Incontinência
urinária e fecal. Dificuldade para comer. Deficiência motora progressiva;
Estágio 4
(terminal): Restrição ao leito. Mutismo. Dor à deglutição. Infecções
intercorrentes.
Os
conhecimentos acumulados nos últimos dez anos de pesquisas na doença de
Alzheimer permitem esperar para breve o aparecimento de tratamentos eficazes.
Estão sendo desenvolvidos compostos que bloqueiam as enzimas responsáveis pelo
mau processamento da proteína beta-amilóide.
Outras linhas
de pesquisa procuram minimizar os efeitos tóxicos dessa proteína administrando
drogas antioxidantes, antiinflamatórios e moléculas que dissolvam os acúmulos
patológicos que ela produz. Dale Schenck e colaboradores, da Elan
Pharmaceuticals de São Francisco (EUA), estão testando uma vacina contra as
placas de proteína beta-amilóide.
Embora esses
tratamentos ainda estejam em fase puramente experimental, começam a surgir as
primeiras evidências de que a doença pode ser controlada. Chegar aos 90 anos
com lucidez parece que não será tão difícil quanto se imaginava há dez anos.
Fonte:
Nenhum comentário:
Postar um comentário